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A luta dentro do judiciário para a defesa e proteção das mulheres
O movimento feminista teve papel fundamental no alcance de direitos e de ações afirmativas no âmbito do enfrentamento à violência contra a mulher, promovendo o reconhecimento de direitos e conquistas femininas em diversos cenários ao longo dos séculos.
Todo esse percurso se compatibiliza com a cronologia dos alcances legislativos que contemplaram as mulheres ao longo dos anos:
A primeira foi a Lei nº 10.886, de 17 de junho de 2004, que acrescentou os §§ 9º e 10 ao art. 129 do Código Penal, por ocasião em que surgiu a violência doméstica, um ano mais tarde surge a Lei 11.106, de 28 de março de 2015, a qual conferiu nova redação aos arts. 148, 215, 216, 226, 227 e 231 do Código Penal, quando foram retiradas da legislação expressões que remetiam à honra da mulher e elevando a pena em razão de vínculo familiar ou afetivo com o agente, bem como a revogação da causa extintiva da punibilidade referente ao casamento da vítima nos crimes sexuais.
Em 2006, com o advento da Lei 11.340, Lei Maria da Penha, a qual, trouxe consigo inúmeras inovações ao ordenamento, bem como o recrudescimento da forma de tratamento aos crimes de violência doméstica, a começar pela determinação de que todo caso de violência trazido pela Lei deve ser apurado através de Inquérito Policial, afastando a incidência da Lei 9.099/95 e remetido ao Ministério Público.
Os crimes sob a égide dessa lei, saem da jurisdição comum para serem julgados nos Juizados Especializados de Violência Doméstica contra a Mulher, com competência cível e criminal para abranger as questões familiares, além disso a dita codificação alterou o Código de Processo Penal para possibilitar ao juiz a decretação da prisão preventiva, quando houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher, alterou também a lei de execuções penais para permitir ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação, em decorrência do uso de violência contra a mulher e previu o encaminhamento das mulheres em situação de violência, assim como de seus dependentes a programas e serviços de proteção e assistência social e prevê um capítulo específico para o atendimento pela autoridade policial para os casos de violência doméstica contra a mulher, estabelecendo a forma como deve agir a autoridade policial e todos os envolvidos no atendimento às mulheres vítimas desse tipo de violência.
Apesar de todas as benesses, a referida lei apresentou um grande déficit, em razão de não ter tratado com a devida atenção o fenômeno das mortes de mulheres em razão de gênero, fato esse ao qual só foi dada a devida atenção muito recentemente, com a aclamada Lei do Feminicídio.
Nesses termos, surge finalmente a lei 13.104, de 09/03/2015, que define como o Feminicídio – a morte da mulher por razões da condição do sexo feminino, e estabelece que existem as chamadas razões de condição de sexo femininoquando o crime envolver violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
Em 2018, entra em vigor a Lei 13.718/18, Lei de Importunação Sexual, que passou a criminaliza atos libidinosos sem o consentimento da vítima, como toque inapropriado e também a divulgação de cena de estupro, de cena de sexo ou de pornografia, com previsões de pena que iniciam 1 a 5 anos de prisão.
Em 2021 foi publicada a Lei 14.132, que altera o Código Penal para incluir o art.147-A, tipificando o crime de perseguição (stalking), cujo objeto jurídico é a liberdade individual e a tranquilidade pessoal, cujo elemento nuclear da ação criminosa vem caracterizado no verbo “perseguir”, que significa ir ao encalço de atormentar, importunar, aborrecer.
Apesar dos avanços legislativos, da constate busca de rompimentos dos antigos paradigmas que refletem em subnotificação ou mesmo na qualidade da aplicação dos parâmetros adequados da norma técnica que padronize o atendimento das pessoas em situação de violência sexual, ou a própria qualidade das técnicas investigativas nos diversos campos de investigação demandados, garantia com que mulheres que sofreram qualquer tipo de violência em face da sua liberdade e dignidade sexual tenham acesso a um atendimento integral, resolutivo, de qualidade e de fato satisfatório, ainda é um cenário que encontra um enorme desafio.
Estender e fortificar a rede de atendimento a mulheres em situação de violência, o que vai muita além das unidades policiais que podem ter o primeiro acesso a demanda, porém não devem ser as únicas a se envolverem no acolhimento, fortalecimento e desenvolvimento de todos os processos que envolvem a repercussão de uma prática de violência sexual, depende também da implementação de políticas públicas específicas em cada ambiente institucional que esteja envolvido nesses processos, para que uniformizem o atendimento, que tenham profissionais habilitados a desenvolver a demanda de forma humanizada, sem desprestigiar a importância de garantir uma estrutura material adequada para o desenvolvimento dos trabalhos.
A importância de que todos os profissionais que tenham contato com demandas dessa natureza sejam habilitados e conhecedores do contexto social da violência de gênero, desvelando uma real necessidade de se garantir uma permanente sensibilização e educação perene dos diferentes profissionais que atuam nesta área, fortalecendo o cenário das políticas públicas que implementem e perpetuem os direitos humanos das mulheres.