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Educação 15/10/2021

Cortes na educação e escola na pandemia: desafios para nossos educadores

Kelly Cristina Ribeiro Bueno
Kelly Cristina Ribeiro Bueno
Professora, gestora em educação e psicopedagoga (DF)
Cortes na educação e escola na pandemia: desafios para nossos educadores
Foto: Roberto Parizotti/Fotos Publicas

Em abril deste ano, após completar um ano em que a pandemia causada pelo COVID-19 se alastrou em todo mundo, parlamentares governistas criticaram a classe de professores ao afirmarem que os docentes “não querem trabalhar”. Naquele momento, havia uma votação no Congresso para transformar a educação em serviço essencial e reabrir todas as escolas, mesmo diante à grave crise sanitária e de saúde pública que se arrastava pelo país.

E agora, é assim que vamos celebrar o Dia do Professor, neste 15 de outubro:

  • Desrespeito por parte de alguns parlamentares e cargos comissionados do Governo Federal;
  • Proposta para que o estudante tenha como professores, seus pais;
  • Falta de investimento nas escolas, em programas e projetos educacionais;
  • Plano de cargos e salários estacionados.

Durante a pandemia, nossas escolas tiveram que se reinventar da noite para o dia com novas metodologias de ensino, além dos professores adquirirem equipamentos tecnológicos por conta própria para aplicarem suas aulas e ainda adentrarem ao universo familiar, se relacionando com as questões psicossociais dos nossos estudantes. Além disso, ainda, junto daqueles estudantes que não tiveram acesso ao ensino remoto, os professores se desdobraram para preparar aulas, se comunicar pelos seus telefones pessoais e disponibilizar suas redes sociais como uma forma de minimizar os impactos de uma educação, até então, desconhecida.

Enfim, nossos educadores e gestores deram uma verdadeira aula de superação dos desafios e dinamicidade durante a pandemia, mudaram suas práticas e fizeram tudo que estava ao seu alcance para garantir a efetiva aprendizagem.

Agora, ao retornar o ensino presencial e híbrido, temos muitos desafios pela frente, além da busca ativa, neste primeiro momento, pois houve uma evasão escolar assustadora. Assim, se tornou necessário elaborar estudos para diagnosticar e entender os processos de aprendizagem de cada aluno, para criar diferentes formas de ensino e tentar amenizar as perdas deixadas pela pandemia.

 Por outro lado, o homescholling foi uma modalidade de ensino em pauta neste ano. Mesmo com a falta de estrutura adequada nas nossas escolas públicas brasileiras, até mesmo com a falta delas e de profissionais da educação ainda se abriu espaço para a defesa desta modalidade pela base governista incentivada por um pequeno grupo de pessoas com interesses particulares.

A escola é um lugar em estudantes vivenciam realidades completamente opostas, o que gera oportunidade para se socializar, errar, aprender e experienciar o mundo, o que de fato é a prática pedagógica, uma vez que há profissionais preparados e treinados para incentivar os potenciais de cada aluno, com técnicas estudadas e aperfeiçoadas para isso, fruto de anos de dedicação.

Assim, querem tirar dos filhos o direito que é constitucional de frequentar a escola. O momento atual exige acolhimento dos estudantes, subsídios das escolas, estudos sobre os impactos do ensino remoto, treinamento dos professores e profissionais da área, investimento elevado na educação, tratando-a de fato como prioridade, para depois debater-se sobre o homescholling, já que se trata de uma das pautas mais delicadas e importantes do país: a educação básica de crianças e adolescentes. Ou seja, as consequências de um ensino mal aplicado gerarão efeitos irreversíveis para toda a sociedade.

Neste contexto, registramos ainda neste ano, o menor orçamento destinado à educação. “A situação é extremamente complexa e delicada, não conseguimos executar nosso planejamento e mesmo tocar a própria consolidação da rede”, diz a professora Sônia Regina de Souza Fernandes, presidenta do Conif (Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica), à Folha de São Paulo.

Além disso, não houve aumento no orçamento para a educação primária e secundária durante a pandemia de Covid-19. Em outros países, foi registrado exatamente o contrário. A falta de investimento nos estudantes e na educação são motivos para o baixo desempenho escolar de muitos adolescentes, uma vez que grande parte deles não conseguiram acompanhar as mudanças geradas pelo ensino híbrido.

Tenho certeza que neste 15 de outubro as redes sociais de todo Brasil irão se render a grandes homenagens aos professores, homenagens dignas e merecidas, mas é preciso também ser um momento de reflexão e luta pela valorização destes profissionais, porque todos nós dependemos dos professores, para nos tornarmos profissionais qualificados, independente da área que escolhermos atuar. Devemos nos unir e clamar para que PEC 32 não seja aprovada, já que ela é um projeto para reduzir a jornada de trabalho e salários, além de terceirizar a mão de obra da educação.

Nós, professores, além de buscarmos sempre nossa melhor qualificação por meio da formação continuada, somos responsáveis pelo futuro de bilhões de estudantes, respeitando suas diferenças e especificidades, mas sem o apoio e sem a valorização profissional adequada, o resultado tem sido o alto índice de adoecimento dos profissionais da educação por doenças psicossomáticas.

Mônica Marcílio Assunção, da Universidade Presidente Antônio Carlos, em seu artigo “Do mal estar ao adoecimento docente em tempos de pandemia” evidencia que “o atual cenário imposto pela pandemia de covid – 19 ocasionou mudanças significativas na oferta da educação escolar devido às medidas restritivas de convívio social que impulsionaram o fechamento físico das escolas. Diante disso, para garantir a continuidade do processo ensino e aprendizagem, os professores foram impulsionados a assumir condições de trabalho domiciliares com novas exigências e responsabilidades a partir do uso de recursos digitais. O enfrentamento a estes novos desafios atrelados a progressiva desvalorização social e econômica do professor na contemporaneidade influencia significativamente em seu bem-estar e qualidade de vida podendo ocasionar o adoecimento, sendo necessário repensar as políticas públicas para valorização e promoção do bem-estar”.  

Mônica Assunção conseguiu em seu artigo trazer a realidade de nós professores, brasileiros e brasileiras. Preocupado com isso e atento a esta realidade, o Deputado Federal Professor Israel Batista conseguiu aprovar por quase unanimidade, na Câmara dos Deputado, o PL 1540/2021 que cria a Política de Bem-Estar, Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho e Valorização do Profissional da Educação. Segundo o autor, deputado Professor Israel Batista (PV-DF), há necessidade de ações voltadas para a atenção à saúde integral e prevenção do adoecimento desses trabalhadores, além de práticas que promovam o bem-estar no trabalho de maneira sustentável, humanizada e duradoura.

Estive à frente da Subsecretaria de Gestão de Pessoas da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal e o cuidado com o servidor público foi o lema da nossa gestão. Para mim, a prevenção é o caminho. Implementamos muitos projetos como oficinas de esporte e música, totalmente gratuitas e realizadas pelas escolas públicas e seus profissionais que queriam contribuir com a saúde de seus colegas. Também lançamos projetos de valorização à história dos readaptados que evidenciavam suas novas práticas pedagógicas, realizamos palestras e seminários de auto cuidado e saúde integrativa, mudamos a prática de nossos atendimentos e concessões aos profissionais, enxergando a cada um (observe que eram quase 80 mil profissionais) não como matrícula ou números, mas como pessoas, cheias de histórias únicas, como verdadeiros contribuidores da sociedade e grandes responsáveis pela promoção de milhares de estudantes.

A política de bem-estar e qualidade de vida no trabalho foi instituída na rede pública de educação do Distrito Federal em 2017, após estudos e evidencias de diversos especialistas. Em 2019, já tínhamos resultados de regressão do número de absenteísmo e presenteísmo.

“Investir em prevenção e qualidade de vida do servidor e na realização de perícias médicas com eficiência e temporalidade evitam a interrupção da prestação de serviço ao cidadão, diminui os riscos físicos e psicossociais, e reduz as despesas para o GDF”, explica a médica do trabalho e subsecretária de Medicina e Segurança do Trabalho da Secretaria de Economia, Ana Paula Delgado Lima. E ela ainda completou: “As doenças que mais acometeram os servidores do governo foram os transtornos mentais e comportamentais. Neste quesito, houve sensível redução de 3,43% na Secretaria de Educação, 0,74% na Secretaria de Saúde e 0,91% nas demais secretarias”.

Assim, como professora da Educação Básica há mais de 23 anos, concluo que, nós professores, queremos neste 15 de outubro aplausos e homenagens, mas, para além disso, queremos respeito, investimento, estrutura e valorização de fato. Não queremos ser enxergados como números, mas como profissionais com a devida importância que temos, pois como o mestre pedagogo Paulo Freire nos deixou de ensinamento: “Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo” e nós somos os grandes agentes desta transformação.

Referências:

http://bandnewsfmrio.com.br/editorias-detalhes/relatorio-mostra-impacto-da-desigualdade-em-r

https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2021/09/brasil-e-dos-poucos-paises-que-nao-aumentaram-recursos-para-educacao-na-pandemia.shtml

https://revistas.uece.br/index.php/ensinoemperspectivas/article/view/6244

https://www.camara.leg.br/noticias/758287-proposta-cria-politica-de-bem-estar-para-os-profissionais-da-educacao/

https://www.agenciabrasilia.df.gov.br/2019/10/05/cai-o-numero-de-dias-de-afastamentos-do-trabalho-motivados-por-doenca/

https://educacao.uol.com.br/noticias/2021/04/20/ricardo-barros-governo-critica-professores.htm

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