Carregando...

Notícias

Emprego, Trabalho e Renda 27/08/2024

Regulamentação da lei que cria o certificado “Empresa Promotora da Saúde Mental” é debatida na Câmara

Regulamentação da lei que cria o certificado “Empresa Promotora da Saúde Mental” é debatida na Câmara
Foto: Pedro Francisco

A saúde mental é um problema grave e ainda subestimado e cercado de preconceitos no Brasil. E alguns dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que deveríamos dar muita atenção a este tema. Somos o país mais ansioso do mundo, e o que mais sofre casos de burnout, diz a OMS. Temos a segunda população mais estressada do planeta e a quinta população mais deprimida. A cada 45 minutos uma pessoa tira a própria vida no Brasil.

O trabalho é um ambiente que pode contribuir fortemente para o agravamento de todos esses quadros. Os números dos Ministérios da Saúde e do Trabalho mostram que uma em cada quatro empresas afastou funcionários por problemas com a saúde mental nos últimos 12 meses; 41% desses afastamentos foram causados por ansiedade, 32% por estresse e 27% por depressão; 9% desses casos se tornaram crises de burnout.

Trabalho como fonte de saúde mental

A Lei 14.831/2024, elaborada pela deputada do Solidariedade Maria Arraes (PE), tem por objetivo combater os fatores no trabalho que possam gerar problemas de saúde mental. A legislação cria a certificação “Empresa Promotora da Saúde Mental” como forma de reconhecer empresas que trabalhem para promover a saúde mental e combater esses problemas.

A certificação ainda precisa ser regulamentada, e a parlamentar pernambucana requereu uma audiência pública na Comissão de Indústria, Comércio e Serviços para que 10 especialistas em saúde e trabalho dessem sugestões para esse novo conjunto de regras.

Efetividade ao longo do tempo

Antônio Virgílio Bittencourt Campos, representante do Conselho Federal de Psicologia, apontou que a maior preocupação é manter a certificação efetiva ao longo do tempo. Para isso, ele explicou que a empresa deve estar disposta a transformar a gestão em torno da melhoria da saúde mental no ambiente de trabalho. Ele também defendeu que haja fiscalização contínua:

“É importante que no processo de regulamentação da lei, ela se alinhe com as normas e regulamentações internacionais e nacionais, como a ISO45003 e a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e Trabalhadora.”

A ISO45003 é uma norma que orienta no sentido de construir um sistema de gestão com a implementação de controles eficazes para eliminar ou gerenciar riscos psicossociais.

Para o vice-presidente da Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho, Hugo Sandall, é preciso lembrar que o trabalho tem importância central na vida das pessoas, e que os efeitos nocivos de um ambiente tóxico de trabalho contribuem para uma epidemia de transtornos de saúde mental, e é isso que precisa ser combatido:

“Essa regulamentação precisa ressaltar a importância de o funcionário trabalhar com a saúde mental em dia. Precisa reconhecer boas práticas de empresas nesse sentido em vez de punir. Práticas como promover o bem estar social, fortalecer vínculos e criar condições de trabalho favoráveis para os empregados. Assim até as empresas colherão benefícios como maior produtividade e menor custos com afastamentos.”, afirmou Sandall.

Combate ao carewashing

O professor de psiquiatria da USP, Dr. Wagner Gattaz, concordou com os colegas psicólogos e acrescentou que é importante combater o carewashing. Essa prática consiste no compromisso que as empresas assumem de oferecer uma cultura positiva, programas e benefícios, mas acabam por não assegurar um ambiente de trabalho verdadeiramente saudável ao longo do tempo, principalmente após conquistarem algum tipo de certificação:

“O importante é transformar os pilares da lei em medidas concretas na regulamentação para que se evite a perda de valor da certificação. É essencial uma avaliação quantificável e contínua dos esforços das empresas nessa área.”, explicou.

Sugestões práticas

Thiago Luguori, médico especialista em saúde corporativa e gestão em saúde, trouxe sugestões concretas para a regulamentação. Ele defendeu a importância da avaliação da saúde dos funcionários como ponto de partida, o trabalho de educação e conscientização contínuo e a criação de um canal aberto para denúncias de abusos de autoridade e liderança tóxica ou sobrecarga no trabalho:

“85% dos empregados afirmam que o trabalho afeta a saúde mental deles e 2,4% do faturamento de uma empresa é perdido em consequência de problemas de saúde mental não resolvidos. Essa nova legislação tem a chance de combater a epidemia de saúde mental das empresas, e para isso precisa de uma regulamentação transparente e eficaz.”

Primeiro passo

Maria Arraes concluiu a audiência celebrando o avanço do debate da regulamentação:

“É muito importante para mim, como autora desta lei, receber os pontos de vista a respeito de um texto que tomou uma dimensão bem maior do que eu esperava e eu agradeço. Vocês são muito bem vindos para continuar contribuindo com essa regulamentação e, assim, fazer um conjunto de normas do jeito que todos nós aqui esperamos, que é uma regulamentação justa e que cumpra esse objetivo, que é o de não somente cuidar e tratar, mas acima de tudo tornar o ambiente de trabalho um promotor da boa saúde mental.”